No seu sangue

Não pretendo aqui dar uma aula sobre a Bruxaria Italiana,até porque ela não pode ser definida.

Na mais vaga idéia,pode-se dizer que é o resquício da antiga sabedoria dos pagãos que habitavam o que seria hoje a região da Itália,(ou quem sabe dos pagãos que fizeram parte do vasto Império Romano) se readaptando aos moldes do Catolicismo e sendo perpetuado de geração em geração.

Minha nonna dizia que eram um “dom”,que o pai dela tinha,havia passado a ela e ela havia passado ao filho que já tinha morrido.Cada geração alguém nascia com algum dom como “vidência”,por exemplo,e então o da geração anterior tinha de lhe ensinar as “orações”,ensinar a benzer,aconselhar,exconjurar e etc.

Minha nonna com certeza não entenderia se eu chegasse e dissesse Diana ou algum nome de entidade parecido,muito hoje vinculada as definições do que seria a Streggaria.

O mais engraçado da história no entanto,é a lenda de Aradia.Aradia para alguns dessa “Streggaria documentada”(com ritos e panteões e definições,o que me parece um tanto confuso visto que é algo familiar e que a Itália como país que conhecemos foi delimitado de um modo muito confuso e repleto de diversas etnias),é a rainha das bruxas.Ela seria filha de Dianna e veio a Terra para ensinar a Bruxaria e lutar contra o Cristianismo,tendo tido grande repercussão entre os camponeses.Aradia ensinava a amaldiçoar e exconjurar,de alguma forma incitando uma resistência,contra o cristianismo e o poder da época.

Nos documentos da Inquisição há uma Aradia acusada de bruxaria,e essa mesma,conseguiu fugir.

Quando visto como entidade,considero-a poderosa e controversa,como todas as entidades que englobam em si a dualidade,a capacidade de abençoar e amaldiçoar.Tais entidades são profundas a nossa compreensão,sempre exigindo um cuidado maior ao se lidar,manipular energias,se referir.

Quando visto como humano e mulher,ela é um exemplo de coragem,da força e da inteligência,por ter apresentado resistência numa época tão difícil e mesmo depois de ter sido presa,conseguir se libertar.

Minha nonna nunca me falou sobre Aradia também.

Há na Genética algo como “Memória genética”,que seria parecido com o “Inconsciente coletivo” da psicologia,como se a memória dos nossos ancestrais fossem arquivadas em nossos genes,nos levando a ter certas atitudes ou respostas frente a algo.

Como todo brasileiro,sou extremamente miscigenada.Não perpetuei ou ouvi os conselhos de minha nonna.Sei pouquíssimo sobre o que os neopagãos chamam de Bruxaria Italiana.Mas ainda assim corre em mim o sangue dessa antiga tradição,fazendo com que eu me sinta parte dela,ao menos por alguns momentos.

Lenda ou realidade,ainda me sinto como protegida de Aradia,como parte de uma vasta ninhada,numa grande árvore genealógica.

Como me disseram uma vez,”você pode negar o seu sangue,mas o seu sangue não nega a você”.Nada disso,repito,é algo determinista;é mais algo universalista.Embora nossa alma não tenha nacionalidade e os laços familiares dessa vida parecem não importar,herdamos mais que genes dos nossos ancestrais;herdamos suas memórias,sua energia,sua bagagem espiritual,filosófica.Guardamos toda essa bagagem dentro de nós,e embora possamos manifestá-la,usá-la,ou não,ela ainda existe,ajudando a compor o que realmente somos.